16 de Setembro a 07 de Outubro de 2022
Vista da Exposição.
EXPOSIÇÃO INDIVIDUAL:
Tânia Geiroto Marcelino
TEXTO:
Rita Anuar
o bico do lápis partiu
se as unhas do indicador e do polegar o pressionarem contra a folha
eu desejaria prestar continuidade à caligrafia formiga a formar-se diante da minha mão
esta é uma escrita estranha a nós pessoas
as flores, os objectos e os outros animais escrevem sem desejo
às vezes à noite eu escrevo para me adivinhar
o risco é uma forma de pensamento mas manusear o risco é sentir
as pausas entre os riscos são a expressão da medida que dista o pensamento do sentimento
não se trata de uma distância prevista em alguns casos ela é da ordem da intuição sensível
noutros casos
é magia
crio imagens de noite primeiro elas imprimem-se no sono para depois se tornarem sonho
durmo na textura do papel
e quando à luz fraca do candeeiro resisto a escrever de dia o desenho é outra coisa
se escolho pintar a folha por inteiro esse é um gesto de simultânea ocultação e liberdade
o que fica por baixo das camadas de grafite e pastel é como a poesia
a escrita do que não sendo a todo o instante visto e vivido é pressentido
acho que é por isso que as árvores e o vento estão tão presentes nas coisas da arte
existe um nível de imprevisibilidade na natureza, que por estar tão perto de nós,
muitas vezes parece que a adivinhamos
qualquer coisa semelhante acontece comigo e com a mancha, a rasura, a linha e os objectos
convivemos, a princípio, sem saber nada uns dos outros
e como alguém que se encanta de dia e de noite junto das plantas à procura de um vestígio de
mudança a trepadeira que criei e que hoje me dá pela ponta dos dedos comigo de braços ao alto
importa-me isso escrever o crescimento
um raio a pousar no lápis
uma palavra deitada
nos ossos
que há um sentido que em nós cresce
até que a mão e o coração se esvaziem
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